Pólítica com tempero: o blog de curiosidades gastronômicas sobre acontecimentos sociais, políticos e culturais

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Mulher para o que der e vier

Ser mulher é mais difícil do que ser homem. Como mulher, jornalista, profissional, filha, namorada, irmã, nunca tive dúvidas dessa afirmação. Mesmo quando algumas pessoas insistem em falar que o gênero feminino domina o mundo, o mercado de trabalho e as universidades, digo: “isso, infelizmente, não quer dizer que exista igualdade entre os sexos”. Concordo quando minha mãe ou, antes ainda, minhas tias-avós diziam: “você não imagina como era na nossa época”. Mas o fato de um dia ter sido pior não significa que hoje seja bom. Como sempre brinco: “uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”.

Por que digo isso com toda certeza?

Trabalhei em diversos lugares e, mesmo vendo que a maioria das jornalistas eram mulheres, os redatores-chefes sempre foram homens. Mesmo quando tive líderes mulheres, eram subordinadas a homens e assumiam um perfil tão masculino que claramente não pertenciam ao mesmo sexo que eu. A socióloga Dulce Withaker diz que as profissões melhor remuneradas, geralmente, são praticadas por uma maior quantidade de homens, pois quando as mulheres começam a ingressar em um setor, ele passa a se desvalorizar.

Os fatos falam por si: duas pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), publicadas em março e em novembro do ano passado, mostraram que as mulheres ganham menos e estudam mais para desempenhar a mesma função que um homem. Elas também enfrentar dificuldades para assumir cargos de comando.

Até no setor gastronômico há diferenciações em vários níveis.

As mulheres são cozinheiras, enquanto os homens são chefs de cozinha. Muitas vezes, quem cozinha em casa, no dia-a-dia da família, é a mulher, ou seja, ela faz o trivial. Enquanto isso, ele é quem faz o jantar especial do sábado ou recebe a fama pela feijoada do domingo. Não sei porcentagens, mas entrevisto muito mais chefs de cozinha famosos do sexo masculino do que do feminino. Isso é visível, pelo menos em São Paulo. Vejam bem, não estou dizendo que não existam cozinheiros homens ou chefs de cozinhas mulheres: Morena Leite e Carla Pernambuco estão aí para comprovar.

Também parece haver grandes diferenças de paladar entre os gêneros. Já ouvi vários chefs falando que as mulheres gostam de pratos leves. Risoto, por exemplo, é comida de mulher; churrasco é de homem. Quando trabalhava na Guia da Cozinha, chegamos a fazer uma pesquisa sobre as preferências gastronômicas dos gêneros e descobrimos que mulheres gostam mais de doces; homens, de salgados. Mas quando eles escolhem uma sobremesa, a preferida é o pudim de leite; enquanto a delas é qualquer uma que tenha chocolate.

Dia desses entrevistei a chef Ariela Dorctors, do restaurante marroquino Tanger, em São Paulo, e conversamos sobre o cordeiro maravilhoso preparado por ela. A profissional comentou algo peculiar: os homens adoram a iguaria, mas é bem mais difícil as mulheres experimentarem o prato (não sabem o que estão perdendo). Sinceramente, não consegui pensar em um por que. Talvez alguém diga que uma questão é biológica, pois elas precisam comer menos; outros podem alegar questões culturais, que as mulheres cresceram achando que não merecem se empanturrar com uma costela na brasa ao molho barbecue. O fato é: azar de quem não come!
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PS (Para Sobremesa): Nem preciso dizer por que escolhi esse tema hoje, né? O Ato Lilly Ledbetter, assinado ontem pelo presidente norte-americano Barack H. Obama, promovendo paridade de salários dos gêneros, oficializa que a desigualdade entre homens e mulheres existe: é visível e latente.

Por Vivian Peres

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Restaurantes na Faixa de Gaza: a gastronomia (im)possível


Imagine administrar um restaurante localizado em uma região onde o abastecimento de comida é precário. Onde boa parte dos alimentos é fornecida por grupos humanitários e assistencialistas internacionais: 80% da população precisa receber ajuda, segundo dados da Anistia Internacional. É isso que acontece há 18 meses com os chefs de cozinha de estabelecimentos da Faixa de Gaza – após o bloqueio imposto por Israel e muito antes dos bombardeios das últimas semanas.

Pode parecer inacreditável, mas a região possui bons restaurantes, a maioria deles localizada em hotéis, além de uma ampla gama de tendas oferecendo comida árabe genuína. Aliás, diga-se de passagem, é muito fácil perceber quão rica e saborosa é essa culinária. São Paulo conta com estabelecimentos de primeira linha que apostam nesse tipo de cozinha. Nos Estados Unidos, os restaurantes ficam abarrotados.

Em reportagem publicada ontem (27 de janeiro), o enviado especial da Folha de São Paulo à Faixa de Gaza, Raphael Gomide, conta que no hotel Commodore, em que está hospedado, só se pode comer frango, frito ou assado, com salada, o que dispensou até mesmo a necessidade de existir um cardápio no estabelecimento.

Mas uma história que me chama muito a atenção é a do restaurante Roots, localizado na Cidade de Gaza. O local aparece em críticas gastronômicas de jornais internacionais, como o norte-americano The New York Times e o britânico Independent. Em 2007, o restaurante foi alvo de explosões, que destruíram um salão anexo. Desconfia-se que os ataques foram realizados por um cliente barrado por tentar jantar no local sozinho: o restaurante só atende famílias ou casais.

Apesar disso, e de seguir a regra de não comercializar bebidas alcoólicas, a proprietária Muna Al-Ghalayini, é considerada uma pessoa liberal para a cultura local. Isso porque, por uma antena parabólica, o televisor do estabelecimento transmite novelas árabes e séries norte-americanas. É possível comer uma salada Daqqa, uma das especialidades da região, vendo um episódio de Friends. Ou, pelo menos, era, antes da comida ficar realmente escassa na região.
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Na foto, ambiente do restaurante Roots. Crédito: Ali Ali (The New York Times, 9 de setembro de 2008)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Feliz ano-novo


Hoje, entramos no ano do Boi. Segundo o horóscopo chinês, é um período da consciência de que trabalhar é preciso. Ano para ter disciplina e responsabilidade. Nada mais necessário, em um período marcado por uma crise causada, antes de tudo, pela combinação perigosa entre a falta de regras e a irresponsabilidade. Em um ano como o que começa nesta segunda-feira, os chineses fornecem a possibilidade de semear frutos e crer no futuro.

Entretanto, justamente neste momento, a capacidade de recuperação da economia emergente mais significativa da atualidade está em xeque. Na última edição impressa do semanário econômico The Economist, lançada no sábado (24 de janeiro), a pergunta do título define o pessimismo com relação ao país asiático: “Strong as an ox?” (Forte como um boi?). O texto é bastante enfático e ironiza a simbologia do ano-novo chinês dizendo que um boi é, normalmente, um touro castrado e assim pode ser descrita a economia do país daqui para frente.

Grosso modo, podemos resumir o panorama futuro dizendo que a China continua crescendo, mas está fazendo isso muito mais devagar e em níveis bem menores. A produção industrial, por exemplo, saiu de um incremento de 18% em 2007, para 5,7% em 2008. Conforme o resto do mundo mergulha ainda mais em recessão, os problemas chineses tendem a aumentar: calcula-se que o PIB não deva crescer mais do que 6% em 2009, o menor patamar em duas décadas.

Porém, não custa nada tentar contar com as velhas sorte e sabedoria orientais. Podemos começar apostando nos bons agouros trazidos pelos biscoitos da sorte, exemplo visível de que o país tem criatividade para lidar com crises. Diz a lenda que eles surgiram no final do século XII como arma para enfrentar o exército de Gengis Khan. Como os inimigos não gostavam desses quitutes, os chineses passavam informações confidenciais para os generais dentro deles. Ganharam a guerra e a dinastia Ming subiu ao poder.

Quem sabe não podemos trocar informações sobre o mercado financeiro por meio de biscoitinhos da sorte? Frases como “procure ser prudente, a economia global agradece” cairiam como uma luva. De qualquer forma, mesmo com trabalho duro, a China dificilmente voltará à velha forma, pelo menos no ano do Boi, mas não custa nada tentar.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Ano-novo chinês

Segunda-feira, dia 26, celebra-se o ano-novo chinês. Por isso, no próximo final de semana, haverá comemorações na Liberdade, em São Paulo. Pretendo comparecer, como gosto de fazer todos os anos. Trarei novidades para alimentar esse blog com ares do oriente e gosto de molho shoyu.

Aguardem...

Um pouco de tempero...
Minha amiga Lelê Godoy disse que saiu hoje uma matéria no UOL com a seguinte frase: "SP é a capital da Gatronomia: todo mundo come todo mundo". E o assunto era o trânsito!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

10 bailes, 120 cozinheiros e uma posse com maratonas


Alguém já foi a dez bailes em uma mesma noite, ou, pelo menos, conhece alguém que tenha ido? Foi o que fizeram Michelle e Barack H. Obama na madrugada da última quarta-feira (22). O engraçado é que a televisão noticiou o fato como algo corriqueiro, a coisa mais natural do mundo: “Michelle e Obama ainda vão participar de dez bailes oficiais. Boa noite!”. Como assim DEZ?

Os dois passaram o dia inteiro em pé, andaram por Washington com um baita frio e ainda tinham uma verdadeira maratona pela frente. Alguns veículos de comunicação ainda questionaram por que eles não levaram as filhas, sendo que elas não iriam mesmo à escola no dia seguinte. Roubaram o bom-senso.

Como o assunto deste blog é política com tempero, não poderia deixar de dar mais detalhes sobre aspectos gastronômicos e sociais dos eventos, tradicionais entre os presidentes norte-americanos.

Pois bem, na verdade, para o casal da presidência, não se trataram de dez bailes completos, mas, basicamente, de dez danças em salões diferentes, cada uma seguida de discurso especial. A bebida oficial foi champanhe, bem específica para a celebração, mas servida quente, graças à grande lotação. Uma das maiores novidades da lista de eventos foi o Neighboorhood Official Ball (Baile Oficial de Vizinhança), destinado a moradores de Washington, ideia do Comitê Presidencial de Inauguração.

Para meu alívio (já estava achando que estou velha), seis dos eventos aconteceram no mesmo local: Walter E. Washington Convention Center.

Quem comanda a cozinha de lá desde os bailes inaugurais do segundo mandato de Bush é o chef Greg Sharpe. O cardápio para as 42 mil pessoas presentes incluia dois pratos principais: Frango Role à Italiana e Torteline com Molho ao Sugo de Tomate Orgânico. Sobremesas só foram servidas em dois dos bailes: os dos estados de Biden e de Obama.

Sinceramente, já fui a incontáveis jantares com melhores escolhas gastronômicas. O menu de Abram Lincoln, por exemplo, foi incrivelmente superior (veja na foto, o cardápio de um dos bailes da posse dele. A imagem é fornecida pelo Smithsonian Institute).

Para deixar tudo pronto até terça, Sharpe comandou 120 cozinheiros, que começaram a trabalhar no domingo. O chef relatou algo muito interessante em entrevista ao Washington Post: para os bailes de Obama, o Serviço Secreto norte-americano foi dez vezes mais severo nas inspeções e regras do que nos do antecessor, verificando cada detalhe da preparação das comidas oficiais. Detalhe: só de molho, foram preparados 900 litros.

Apimentadas: Lista dos bailes de Obama

- Baile Inaugural da Juventude: para convidados entre 18 e 35 anos. Preço: $75. Local: Washington Hilton.

- Baile Inaugural dos Estados Natais de Obama: Para convidados de Illinóis ou Havaí. Preço: $150. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural dos Estados Natais de Biden: Para convidados de Delaware ou Pensilvânia. Preço: $150. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural da Costa Leste: Para convidados da Costa Leste, Porto Rico ou Ilhas Virgens. Preço: $150. Local: Union Station.

- Baile Inaugural da Costa Oeste: Para convidados da Costa Oeste ou Samoa. Preço: $150. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural do Meio Atlântico - Para convidados de Nova Iorque a West Virgínia. Preço: $150. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural do Meio Oeste - Para convidados de Kansas, Dakota do Norte e Missouri. Preço: $150. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural do Sul – Para convidados dos estados do Sul. Preço: $150. Local: National Guard Armory.

- Baile Inaugural da Vizinhança – Para moradores de Washington, D.C., convidados. Gratuito. Local: Walter E. Washington Convention Center.

- Baile Inaugural do Presidente – Para convidados, autoridades e militares. Gratuiro. Local: National Building Museum.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Aloha! Obama gosta de PF

“You can’t really understand Barack until you understand Hawaii”, Michelle Obama

Sai o Texas e entra o Havaí. É incrível como informações simples podem esclarecer, e muito, fatos aparentemente complexos. De um lado, caçadas, calor desértico, cawboys, John Wayne, petrolíferas e muitos veteranos da guerra do Vietnã. De outro, praia, sol, mar, cenários paradisíacos, luaus, camisas floridas, Jack Johnson, surfe e turismo. De um lado, Bush e a guerra. De outro, Obama e a esperança.

Enquanto o Havaí é um dos estados mais multiculturais dos Estados Unidos, formado por europeus, polinésios, invadido por japoneses, o Texas é economicamente bastante desigual: com algumas das famílias mais abastadas do mundo, dividindo o terreno com mexicanos que cruzam a fronteira para lavar o chão da América. Interessantíssimo!

Gastronomicamente falando, as diferenças também são visíveis e bastante representativas. Os texanos possuem uma fascinação histórica por pratos com milho. Também são apaixonados pelo tradicional churrasco ao melhor estilo norte-americano, com molhos adocicados e carnes que parecem exóticas aos nossos olhos. Desta forma, a influência mexicana é uma das melhores notícias gastronômicas. O que faz com que essa seja a culinária preferida de Bush. Em pelo menos um ponto, tenho que admitir: ele é esperto.

Já os conterrâneos de Obama inventaram o tradicional prato de almoço havaiano (Hawaiian Plate Lunch), uma espécie de PF local, formado por duas conchas de arroz branco, salada de macarrão com maionese e uma porção de proteína. Aliás, esse último item fica a gosto do freguês: porco ao estilo chinês, carne coreana, salmão japonês, salsichão português, steak americano ou, até mesmo, um ovo frito. Acreditem ou não, o saudável presidente não deixa de comer essa iguaria quando visita a ilha.

As origens do prato: em idos de 1880, um fluxo migratório levou trabalhadores da China, Coréia, Japão, Portugal e Filipinas para o Havaí. Eles atuavam nas plantações de frutas e açúcar, em condições precárias e, na hora do almoço, comiam arroz com qualquer carne que tivesse sobrado no jantar do dia anterior. Qualquer semelhança com o seu almoço é mera coincidência.
Um homem que come um PF no Havaí, certamente, é uma promessa para um mundo como o nosso!

O New York Times desta segunda-feira (19 de janeiro) percebeu o quanto a calma havaiana de Obama pode ser um trunfo para os tempos difíceis. O próprio presidente diz precisar do descanso local. Caso contrário: “você perde a noção das coisas”, diz ele. Segundo o artigo de Roger Cohen, o presidente eleito restaura o “mito americano da possibilidade”. Ou seja, a ideia de que a America é “home of the brave” ou “a land of opportunities”. A terra em que um afro-descendente do Havaí pode ser presidente é um lugar que, certamente, supera qualquer crise.

Vamos ver se vai acabar em pizza, que, aliás, é outro dos pratos prediletos no novo presidente.

* Um pouquinho de coentro: Ontem, assistindo Manhattan Connection, vi o Diogo Mainardi dizer que a melhor coisa do Obama é que ele não é o Bush, concordo. Mas acho que há mais coisas boas.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Apimentadas

- Alguém, por favor, consegue me explicar o que Lula e Bush têm em comum? A imprensa não para de noticiar a incrível ligação de adeus que o nosso excelentíssimo presidente recebeu do ex norte-americano hoje. O que realmente me espanta é falarem que os dois possuem semelhanças e que, por sua trajetória, o nosso presidente estaria muito mais perto de Bush que de Obama. Alguns fatos realmente me assombram. Certas coisas pegam mal! Ainda mais para um líder popular como Lula, seria melhor ser amigo do Fidel ou do Hugo Chávez para tentar, pelo menos, ter certa coerência à política e à própria biografia. Fico imaginando como seria o ex-presidente norte-americano pescando em terras brasileiras com seu companheiro de São Bernardo. Medo, pânico, aflição!

- Quando o ex-governador Geraldo Alckmin não foi nem para o segundo turno das eleições para prefeito, muita gente especulava como seria o futuro dele. José Simão chegou a dizer que a Dona Lu teria de distribuir currículos do marido, então desempregado. Mas, realmente, não há nada que um bom networking não resolva. Ontem, Alckmin já ganhou o seu carguinho no Governo Serra, com direito a orçamento milionário.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Blogar ou não blogar

Todo pessoa que gosta de escrever deve ter um blog. Se você é formado em comunicação, então, é praticamente uma obrigação. Depois de ouvir perguntas exclamativas - como “por que você não tem um blog?” ou “você tem tantas ideias legais, por que não cria um blog?” – cá estou eu, inaugurando o “Política com tempero”.

Na verdade, não tinha um blog por timidez, porque, acreditem ou não, mantenho alguns diários – daqueles antigos, escritos à mão com papel e caneta - com muitos textos de diferentes épocas. Nunca me senti preparada para jogar meus textos na rede, mas acho que chegou a hora: atingi o amadurecimento profissional necessário.

Esse blog une uma paixão natural com uma obrigação que se transformou no ar que eu respiro diariamente: política e gastronomia, respectivamente. Pode parecer impossível, porém, estão intimamente relacionados. Não se faz política sem um bom jantar, um bom coquetel, um bom canapé e as bebidas mais requintadas.