Pólítica com tempero: o blog de curiosidades gastronômicas sobre acontecimentos sociais, políticos e culturais

domingo, 15 de novembro de 2009

A cerveja e o menino



O Brasil é campeão mundial em reciclagem de latinhas, com um índice de 96,2%, segundo a Associação Brasileira de Alumínio (Abal). Os números não negam a supremacia nacional e, vira e mexe, alguém se gaba do fato. Mas qualquer pessoa um pouco mais esclarecida consegue perceber que a liderança brasileira não acontece graças à consciência socioambiental da população, muito menos a programas governamentais: é uma questão de necessidade.

O rapaz da foto tem apenas 5 anos de idade, mas já conhece a realidade da reciclagem muito bem. Mora na pequena praia de Ponta Negra, em Paraty, litoral do estado do Rio de Janeiro. Apesar de o paradisíaco local estar na região Sudeste do País, tida como a mais desenvolvida, não conta com um privilégio que todos consideram indispensável – ainda mais em tempos de apagão: a luz elétrica.

A praia, de pequena extensão, possui dois bares, que por terem gerador, conseguem vender cerveja gelada aos visitantes. Nos finais de semana e feriados, muitas das pessoas que se hospedam na Praia do Sono, ao lado, fazem uma trilha para a Ponta Negra. A praia lota e o menino se posiciona estrategicamente no Bar da Bikinha, esperando os turistas degustarem uma “gelada”. Assim que acabam, vai, educadamente, buscar a latinha restante.

Antes de posar para a foto acima, ele mostrou a sua sacolinha azul lotada e me disse: “já estou com umas dez latinhas, meu pai vai ficar feliz”. Alumínio vale dinheiro, essa é a grande questão. O pai de garoto é pescador. Para bom entendedor...

Caio é a prova de que o país que é capa da The Economist, vai sediar Olimpíadas e Copa do Mundo, ainda tem muito chão pela frente. No dia em que formos campeões de reciclagem por consciência ambiental e não por necessidade de subsistência, podemos começar a conversar.
Por Política com tempero

Vida e caos

Percebo que a minha vida está um caos, quando fico mais de um mês sem atualizar esse blog. Desde outubro, quero escrever sobre uma viagem que fiz para a Ponta Negra, que rendeu algumas considerações gastronômicas. Espero fazê-lo dentro em breve. Na quinta-feira, acabam as minhas aulas e tudo deve melhorar... rsrs

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Quantos minutos você trabalha para comprar um Big Mac?


Há alguns anos, a revista The Economist publica um ranking que mede o poder de compra de determinadas moedas baseando-se em um item simples: o custo do Big Mac em cada país. A ideia é bastante válida, uma vez que o lanche carro-chefe do McDonald`s é um dos produtos mais "iguais" em todos os lugares do mundo.

Recentemente, a revista publicou outro índice alternativo, ainda considerando o sanduíche do Ronald. O novo ranking mede quanto tempo uma pessoa tem que trabalhar em 73 cidades do mundo para ter dinheiro para adquirir o lanche. Dessa forma, pode-se verificar não só a valorização da moeda em si, mas ter uma ideia do custo de vida e da capacidade de consumo da população.

A cidade de Obama, juntamente com Toronto e Tóquio são os lugares do mundo onde o trabalhador fica menos tempo na labuta para saborear o sanduíche: apenas 12 minutos. Para contrastar, em locais como Jacarta, Nairobi e Cidade do México, o tempo médio são duas horas. A representante brasileira da lista é São Paulo, onde um habitante precisa trabalhar em média 40 minutos, pouco menos que a média global.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Cuba Libre!

Ao ler o rótulo de uma garrafa de Bacardi, provavelmente estará escrito: engarrafado em Porto Rico.

Entretando, o rum está para Cuba assim como a cachaça está para o Brasil. A principal semelhança é que os dois produtos são fabricados por meio da destilação da cana-de-açúcar. O mojito é a caipirinha cubana. A Família Bacardi era uma das mais tradicionais da ilha.

A primeira fábrica deles foi fundada em 1862, em Santiago de Cuba, por Don Facundo Bacardi Masso.

Desde então, a história da família Bacardi mistura-se com a da ilha. O filho mais velho de Facundo, Emilio Bacardi, foi exilado do país por promover atividades anticoloniais. O neto do fundador da Bacardi lutou no exército rebelde da independência.

Foi inclusive depois da guerra da independência que a família criou um drinque bastante temático: o Cuba Libre. No início do século XX, durante a Lei Seca norte-americana, a Bacardi se tornou ponto de visitação dos turistas dos Estados Unidos.

Na década de 1930, algumas garrafas de rum Bacardi foram produzidas fora de Cuba pela primeira vez, nas fábricas de Porto Rico e do México.

Mas o sonho acabou em 1959, com a revolução e o comunismo. A família Bacardi deixou o país abandonando todas as plantações de cana, confiscadas pelo estado durante o processo de reforma agrária. Os ilustres cubanos se mudaram para as Bahamas e passaram a passaram a maioria das operações para a fábrica de Porto Rico: aí está a explicação contida nas garrafas.

Até hoje a Bacardi Rum Co. procura recuperar suas propriedades de açúcar expropriadas pelo governo revolucionário e é uma das maiores opositoras ao regime castrista.

Hoje, o estado de Fidel produz o Havana Club: El Ron de Cuba... É um rum de exportação, produzido no bairro de Habana Vieja, na capital (foto).

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Onde está Wally? Ou melhor, Che!


A foto acima mostra o velório da estudante morta durante protestos contra o governo golpista em Honduras. O que me chamou a atenção foi a foto do Che Guevara ao fundo. Reparem!

Mais uma prova de que Fidel não é, nem nunca foi, bobo ao posicionar a foto de Che estrategicamente por toda a ilha. Ícone eterno!

domingo, 20 de setembro de 2009

Embalagens de produto

Se a minha família se mudasse para Cuba hoje, só a minha mãe teria alguma possibilidade de conseguir um emprego. Tem formação em serviço social, um dos pontos altos do país.

Cansei de ouvir que ser jornalista em Cuba é muito perigoso. Em outras palavras, não há liberdade de imprensa. Ou seja, eu teria que suar a camisa para publicar qualquer reportagem.

Mas quem, com toda certeza, ficaria desempregado é meu irmão: publicitário.

Essa é a profissão mais irrelevante em um país comunista. Os motivos são fáceis de serem observados. Se não há concorrência, nem poder de consumo, nem liberdade de compra: para quê pagar um profissional cujo objetivo principal é alavancar vendas?

O supermercado é o local de Cuba onde essa total irrelevância fica completamente evidente. Com certeza, não existem empresas de trade marketing na ilha. Não há gôndolas centrais, nem displays, nem banners. Trabalho de PDV? Com qual finalidade?
Existe uma pequena gama de produtos dispostos milimetricamente nas prateleiras e há diversos seguranças espalhados pelos corredores, monitorando os passos de todos os frequentadores. As embalagens de produtos cubanos são praticamente iguais: possuem apenas as informações essenciais no rótulo. Não há licenciados, nem logos, nem identidade de marca...

A mesmice é quebrada pelos importados: há itens brasileiros, franceses, espanhóis, argentinos, venezuelanos. Marcas como Nestle, Bauducco e, pasmem, as maravilhosas sandálias Dupé (foto). Ou alguém aí achou que eram Havaianas?
Havaianas é coisa para europeu!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Tão perto, tão longe: fim da URSS e exploração turística


No balneário cubano de Varadero, a menos de 200 km de Havana, tem-se uma vista maravilhosa para o mar do Caribe. Azul, cristalino, calmo e paradisíaco. Lugar ideal para atrair pessoas do mundo inteiro.

Um potencial comercialmente inexplorado até o início da década de noventa, quando o turismo passou a ser um dos maiores produtos de exportação cubanos. Esse processo não aconteceu por vontade do governo, mas por necessidade. Essa pequena abertura de mercado se deu pouco tempo depois da derrocada da URSS e da queda do muro de Berlim. Quando perdeu seus maiores parceiros comerciais, Fidel teve que se virar e aproveitou o que a ilha poderia oferecer de melhor.

O primeiro resort, Sol Meliá Palmeras, foi construído em 1990 e inaugurado pelo próprio Fidel Castro. A foto do ditador, a história do local e o hino revolucionário de Cuba estão na porta do empreendimento, que é uma sociedade entre os espanhóis da rede Meliá e o governo de Cuba. De lá para cá, aproximadamente um resort é inaugurado ao ano na cidade.

Hoje, são 18.

A renda que entra da exploração turística tornou possível algumas pequenas modernizações na infraestrutura do país caribenho: compra de novos ônibus, pavimentação de rodovias, presença de carros europeus 0km para aluguel.
A maioria dos cubanos deseja trabalha na rede hoteleira, onde ficam mais próximos desse mundo moderno. Dentro dos resorts, é possível se esquecer de que estamos em Cuba, das pobrezas do país e de todas as mazelas pelas quais passam a população. É quase como visitar a Disney.

A comida também.

Dentro dos resorts, existe um mundo mágico de aromas e sabores. São restaurantes dos mais diversos tipos de culinária mundial: italiana, alemã, espanhola, chinesa e, é claro, caribenha. Há opções para todos os tipos de paladares. A maioria dos vinhos vem da Espanha, mas é o rum cubano que cai nas graças dos turistas.
Uma breve visita ao centro de Varadero traz a realidade regional: os cubanos comem em carrinhos de lanches e pizzas (foto), sem guardanapo, pois o papel é escasso e o mais curioso é que, por motivos óbvios, as travessas são retornáveis. Como tudo na ilha de Fidel, os utensílios têm décadas de existência.
PS: Lembrando que os norte-americanos não podem visitar Cuba

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Muro de Berlim de sorvetes

Final de tarde quente de Havana. Faz 32 graus. Acredite, a sensação térmica é de muito mais. Em uma caminhada rápida pelo bairro de Plaza de La Revolucion, é possível observar uma movimentação estranha de cubanos. Em grupos, grandes ou pequenos, todos caminham para o mesmo lugar: a praça central.

Nela, está localizada a sorveteria Coppelia, inaugurada no dia 4 de junho de 1966. Após os primeiros anos da revolução, as três principais marcas de sorvete – Guarina, Hatuey eSan Bernardo –haviam desaparecido. A inauguração da Coppelia foi motivo de festa. 43 anos depois, os cubanos ainda se deslocam de todos os lugares de Havana, ou até mesmo de outras províncias, para se refrescar com um sorvete. Em plena segunda-feira, as filas são longas e é preciso resistir à espera.

Aos finais de semana, o local recebe mais visitantes do que o permitido pelo espaço físico. E olha que a sorveteria ocupa grande parte do o centro da praça, além de ter quatro salas com mesas no andar de cima. Há militares por toda a parte. Também há correntes cercando as filas e o entorno da praça. O acesso ao local onde os sorvetes são vendidos é restrito.

O mais curioso é que, enquanto os moradores da ilha se aglomeram nas filas, os turistas podem comprar o mesmo sorvete em uma barraquinha ao lado. O que separa os dois produtos? A resposta é simples: os vendidos aos turistas custam 70 vezes mais.
Não, você não leu errado. O mesmo sorvete que custa 1,10 peso cubano para eles, sai por 2,80 CUC para nós. Como cada CUC vale 25 pesos cubanos, é só fazer as contas. Um turista paga 6,2 reais por um sorvete de massa de uma bola e pode escolher entre três maravilhosos sabores: morango, amêndoas e laranja.

Lembrando que esse não é o único sorvete de Cuba. Existem diversas marcas conhecidas nossas no país, como a Nestle. Mas acho que ficou bem claro por que todos os locais preferem a Coppelia, não é mesmo? E não tem nada a ver com variedade de produtos, ambiente, propaganda, estratégia de marketing, qualidade...

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Jorge, o pintor

Esse rapaz sorridente da foto se chama Jorge. É um cubano de 38 anos e uma filha de dez meses. Trabalha como pintor de paredes. Ganha 210 pesos cubanos por mês. Tem 38 anos. Sonha em fugir para um país como o Brasil e montar seu próprio negócio.

Vive no centro de Matanzas, a capital da província homônima, no norte de Cuba. O local foi o último ponto por onde passou a revolução do general Guevara. A cidade possui um monumento na Plaza de La Libertad em homenagem aos heróis do movimento.

Como todos os outros habitantes da ilha, Jorge recebe uma cesta básica do governo, descontada do salário. Mas, segundo ele, essa comida dura no máximo 15 dias.

Depois que os alimentos acabam, ele precisa se dirigir ao mercado da cidade para adquirir mais comida. Tudo a preços super altos. Um quilo de carne de porco, por exemplo, não sai por menos de 35 pesos cubanos, 16,6% do salário de Jorge.

Para conseguir comprar o leite da filha, repassa “habanos”. Em outras palavras: revende charutos no mercado negro, para os turistas. A carga é desviada das fábricas da capital do país.

Existem milhões de cubanos como Jorge.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Como comem os turistas, como comem os locais

Para entender Cuba, é preciso saber que o país vive a dualidade da existência de dois ambientes que circulam paralelamente dentro do mesmo. Esses universos se diferenciam por um ponto principal: o dinheiro. São duas faces da mesma moeda.

De um lado, está o peso cubano, aquele que possui os heróis da revolução estampados. A cédula de três pesos, por exemplo, carrega a famosa foto de Che Guevara "hasta la victoria siempre", a mesma usada nas camisetas na Praça da República, centro dos revolucionários e bichos-grilo paulistanos. Do outro lado, está o peso convertible (CUC), cuja identidade gráfica "imita" a do euro.

A realidade do câmbio: cada CUC vale 1,26 euros, ou 0,80 dólares ou 25 pesos cubanos. Um habitante da ilha ganha, em média, 210 pesos cubanos por mês, ou seja, menos de nove pesos "dos turistas".

A moeda dos revolucionários lidera uma realidade barata dentro país, mas com pouco poder de compra de produtos industrializados ou importados. Quem ganha em peso cubano só tem acesso ao que é produzido em Cuba (ou o que é subsidiado por nações "irmãs"): basicamente comida não-industrializada (leia-se commodities), roupas em linha de montagem, produtos baratos, simples e de pouca tecnologia.

Para quem tem acesso aos CUC (apenas turistas ou profissionais que recebem gorjetas na hotelaria), há uma ampla gama de alimentos importados da Europa e América Latina. É possível achar, até, Coca-cola, além de produtos de marcas conhecdas pelos brasileiros, como Bauducco. Entretanto, uma torrada que custe 1 CUC representa mais de 10% do que a maioria dos cubanos ganha mensalmente. Deu para sentir o drama?

Um cubano dificilmente conseguirá experimentar comidas como as nossas: chocolates gostosos, biscoitos recheados, pratos congelados, pizza semipronta... Em tempos de obesidade latente, seria um problema ou uma sorte?

E o Obama segue com o embargo por mais um ano!

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Na foto: Plaza de la Revolución

Cuba, economia, política e comida



Durante todo este mês, política com tempero traz uma série exclusiva de artigos sobre a terra dos irmãos Castro. Falaremos sobre comidas cubanas, moedas cubanas, sorvetes cubanos, restaurantes cubanos, bodegas cubanas, rum cubano e povo cubano.

Enfim, tudo sobre a simpática e complicada ilha.

Para começar, uma explicação sobre como funcionam as duas moedas locais. Sem essa compreensão, fica impossível entender as dualidades da exótica culinária de Cuba.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Um site onde nem tudo acaba em pizza...

Agosto realmente é o mês do desgosto rs. Mês em que eu fiquei devendo posts. Mas para não dizer que estou alheia ao mundo, quero indicar um novo site que tem tudo a ver com esse blog. Um site que mistura política e gastronomia, pois tem como maior objetivo não permitir que tudo acabe em pizza.

http://www.museudacorrupcao.com.br/

Naveguem e preparem o omeprazol, pois dá enjoos e azias.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Eles bebem, elas comem

Best Seller, o livro Comer, Rezar, Amar, da autora norte-americana Elizabeth Gilbert, causou identificação em mulheres de trinta países. A história de uma balzaquiana tentando se encontrar após uma dolorosa separação vendeu mais de quatro milhões de exemplares.

Agora, surge uma versão divertida voltada para eles: Beber, Jogar, F@#er, do escritor humorístico Andrew Gottlieb. Parodiando o livro de Gilbert, o autor traça paralelos entre os gêneros

Enquanto a publicação dela é autobiográfica, a dele conta a história fictícia de Bob Sullivan. Em ambos, os personagens querem se livrar da dor conhecendo novos lugares.

Ele faz sexo na Tailândia, ela faz amor na Indonésia. Ele joga em Las Vegas, ela reza
na Índia. E, é claro, ele bebe na Irlanda, ela come na Itália.

Nada mais emblemático para pensarmos as disputas de gênero da sociedade do que o fato de que as mulheres comem enquanto os homens bebem. Em outras palavras: enquanto nós engordamos, eles se divertem.

domingo, 26 de julho de 2009

Culinária fusion e revolução do cérebro!


Uma coisa é certa sobre os modismos: eles existem com cada vez mais força e fica difícil não tocar no assunto. Quando o tema é gastronomia – como é o caso deste blog – é obrigatório falar de culinária fusion, a bola da vez. Na verdade, não é de hoje que ela existe, mas foi em 2008 que se difundiu em muitos dos principais restaurantes do País.

Como minha missão é misturar tendências culinárias e políticas, digo com propriedade: esse tipo de gastronomia é resultado de uma nova ordem mundial. Em um mundo onde as distâncias se encurtam cada vez mais e a criatividade é diferencial, misturar sabores e experimentar novas maneiras de fazer torna-se essencial para a sobrevivência de quase todos os chefs (ou pelo menos daqueles que desejam ganhar estrelas Michelin ou, até mesmo, no Guia da Folha).

Dizem que Alex Atala (foto) foi pioneiro em temperar tradições internacionais com toques de brasilidade. Fica difícil saber ao certo se foi ele, mas uma coisa não se pode negar: o chef-sensação foi o primeiro a fazer alarde sobre o assunto. Considerando que algo só existe realmente quando as pessoas conhecem, Atala faz jus ao rótulo de precursor.

No livro “A revolução do lado direito do cérebro”, o autor norte-americano Daniel Pink aplica conceitos que têm tudo a ver com essas tendências: já não vale mais fazer bem, é preciso fazer diferente. O lado esquerdo do cérebro, sistemático e lógico, é útil, mas não suficiente. Para conseguir atingir um diferencial nos dias atuais, é preciso usar o lado esquerdo: criativo, histórico, lúdico, empático e sinfônico.

A gastronomia é apenas uma forma de representação desse novo mundo.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O almoço do brasileiro (parte III): O retorno dos excluídos

O maior problema do Brasil é a desigualdade social. Qualquer pessoa com o mínimo de senso de observação – indo do ex-presidente ao atual – consegue perceber que há poucos extremamente ricos, até para padrões europeus e norte-americanos, e muitos extremamente pobres.

Em uma cidade como São Paulo, a mais abastada do País e com duas lojas Tiffany’s, fica ainda mais fácil observar isso. O horário do almoço torna-se momento emblemático. Os restaurantes dos Jardins – onde existem todos os tipos de refeições caras –ficam abarrotados. São pessoas fechando negócios, fazendo networking ou apenas se refestelando para dar uma pausa na rotina estressante.

Enquanto isso, lá dentro, os colaboradores comem o que dá. Além disso, pessoas que trabalham em bairros muito chiques ou em grandes centros comerciais, porém com cargos menores, precisam se virar para não gastar o salário inteiro comendo PFs de 30 reais. O jeito é vender tickets refeição e levar o almoço pronto de casa.

Mesmo com essa solução, acontecem dois problemas básicos: os tickets agora são de cartão e o valor da cesta básica não para de crescer.

Explicando: quando os tickets ainda eram de papel, era fácil repassá-los. Hoje, é preciso encontrar um restaurante que se disponha a descarregar o valor, descontando o preço cobrado pelas operadoras e juros módicos. Afinal, ninguém faz nada de graça. Além disso, a alimentação é um dos itens que mais aumentaram de preço segundo o IPC-Fipe (Índice de Preços ao Consumidor): 0,19% em maio.

Tem que ser malabarista para equilibrar o orçamento!
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Na foto, Fasano, restaurante símbolo da desigualdade.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Deus é amor... e comida

“A religião é o ópio do povo”. Certas frases são inesquecíveis e atemporais e essa – atribuída a Karl Marx – é uma delas. Em uma espécie de pesquisa antropológica, no mês passado, visitei o templo “mundial” da Igreja Pentecostal Deus é Amor (IPDA). Foi uma experiência única, que indico a qualquer pessoa que queira entender melhor o mundo.

Gigante, o templo localiza-se na Avenida do Estado em São Paulo. Recebe, aos domingos, fiéis do Brasil inteiro e, até mesmo, do exterior. Durante horas, é possível ouvir missionários pedindo dinheiro ou, como eles preferem chamar, dízimo. O ponto-alto do culto é a chegada de David Miranda, fundador dessa vertente evangélica.

Já idoso, ele aparece em uma cúpula localizada no centro do palco. Dizem que os vidros são blindados, pois o missionário recebeu inúmeras ameaças de assassinato. Se é tudo estratégia de marketing ou verdade, nunca vamos saber.

Durante a cerimônia, fiéis que consideram ter alguma coisa para contar sobem ao palco. Então, começam as sessões de milagres, quando cada uma dessas pessoas conta por que motivo considera que se salvou, as mudanças que teve na vida depois de começar a freqüentar o tempo.

Na primeira fileira do auditório, posicionam-se as pessoas com problemas de saúde (algum tipo de deficiência física ou, até mesmo, em camas posicionadas na frente do palco). O momento mais triste é quando o missionário resolve curá-las: alguns cadeirantes levantam-se e o milagre acontece, deixando a plateia em polvorosa.

Paralelamente ao culto, existe lá fora um verdadeiro mercado da fé, uma atração à parte, mas que, certamente, torna o programa dominical ainda mais atrativo às famílias que frequentam o templo. Todo tipo de comércio: roupas, bíblias, CDs, DVD e... comida, muita comida. Tudo feito sem procedência, com higiene duvidosa, mas todos os quitutes são apreciados pelos fiéis.

Certamente, todos retornam para casa com a certeza de ter vivido um dia especial, recebido alento espiritual e comido com qualidade. Um tema para reflexão.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Mais fiscalização, menos pipoca

Um pipoqueiro com “ponto” em frente à PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) teve o seu carrinho de pipocas apreendido por fiscais municipais. No mesmo dia, um café nos Jardins teve as mesas e cadeiras da calçada apreendidas. Na PUC, provando que ainda existe consciência política entre os universitários, houve uma comoção geral. No café, o dono levava às mãos à cabeça pensando no provável prejuízo.

Essas duas cenas vivenciadas na semana passada são decorrência de ações adotadas pelo prefeito da cidade de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM). O líder executivo da maior cidade do País resolveu fiscalizar a presença de mesas e cadeiras nas calçadas da cidade. Também foram tirados das ruas os ambulantes.

Todos querem uma São Paulo mais limpa e organizada, disso ninguém duvida. Mas toda cidade tem identidade. Muitas vezes, pode ser aliada a certa irregularidade e caos. Imagine se a lei Cidade Limpa passasse pela Times Square? O ponto turístico de maior relevância de Nova Iorque perderia completamente a estética e o charme que atraem pessoas do mundo inteiro.

A mesma coisa acontece, por exemplo, na Vila Madalena, onde o ato de tomar uma cerveja ao ar livre dá brilho ao bairro boêmio. Da mesma forma, a Rua Oscar Freire é um centro de compras conhecido internacionalmente e ganha glamour por seus bancos e mesinhas, onde é possível comer quitutes e beber um bom café observando o movimento de sacolas. Os exemplos são infindáveis.

Na PUC, os estudantes, acostumados a comer sua pipoquinha durante o intervalo das aulas, quase lincharam o carro dos fiscais da prefeitura. Foram necessárias intervenções dos seguranças da instituição para conter a fúria. Resultado: um pipoqueiro sem emprego.

E a pergunta é: o que São Paulo realmente ganha com isso?

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Gastronomia, cultura e globalização

A globalização da cultura realmente existe: hoje tive ainda mais certeza. Estava apurando uma pauta sobre o Recife, levando em conta os principais pontos turísticos da cidade. Nesse pacote, não podia faltar gastronomia, o meu tema preferido.

Pedi para o assessor de imprensa da prefeitura da cidade me passar algumas dicas legais e que fugissem um pouco dos roteiros convencionais turísticos. A resposta obtida foi a seguinte:

"Como você pede coisas que não estão nos roteiros tradicionais, gostaria de citar o Bar Central (foto), no centro da cidade, que é pilotado pelo judeu André Rolemberg e serve pratos judaicos e árabes. Além de ser ponto de encontro de artistas do Recife (algumas vezes gente conhecida do cinema, como Dira Paes e Mateus Nachtergaele), o local tem boa música, com destaque para bossa nova cantada em hebraico."

Achei o máximo! O que Tom e Vinícius pensariam disso. Nem imagino!

Lembrei um pouco da época em que morei em Washington, DC, nos EUA. Certa vez, indicaram-me um bar chamado Bossa, que - como o próprio nome já diz - tem música brasileira. Localiza-se no charmoso bairro da Adams Morgan, uma espécie de Vila Madalena da cidade. Quando cheguei, avistei um negro tocando Djavan, com uma linda voz e um português perfeito (impossível para um norte-americano), mas o sotaque era bem estranho.

Perguntei duvidando: “ele é brasileiro?”
A resposta foi: "não, é de Cabo Verde".

Legítima música brasileira, cantada nos Estados Unidos por um negro de Cabo Verde. Milton Santos iria se chocar.

Por falar nisso, esse bar tinha pasteizinhos e uma caipirinha deliciosos.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O corte de carne da moda

Tudo tem moda. Existe o cabelo da moda, a gíria de moda, a roupa da moda, a comida da moda... Agora, o máximo é ter corte de carne da moda! É claro que a ideia tinha que vir de uma churrascaria de ponta: a Vento Haragano.

Conhecida por estar entre os melhores da capital paulista, o estabelecimento agora tem a Costela Premium. O release diz: "É um corte tradicional dos gaúchos, que a chamam de ripa da chuleta. Corresponde à bisteca do contrafilé".

Em outras palavras: rico pode chamar contrafilé de costela premium. Isso é chique! Isso é luxo!

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Como encarar bem a neurose do porco


Indicados

Sites que indico para quem quiser fontes alternativas de informação:

Mídia Independente
http://www.midiaindependente.org/

Transparência Brasil
http://www.transparencia.org.br/

Congresso em Foco
http://www.congressoemfoco.com.br/

Por Vivian Peres

domingo, 31 de maio de 2009

O almoço do brasileiro – Parte II: A humilhação contra-ataca

A partir de hoje, nunca mais reclamarei da porta giratória da instituição bancária que frequento. Nem preciso dizer que, como toda mulher, sou sempre barrada no detector de metais e tenho que tirar uma infinidade de bugigangas da bolsa para conseguir adentrar o local.

Mas neste dia chuvoso, lembrei que tinha de ir ao banco justamente no pior horário: o almoço. Exatamente naquela uma hora em que as pessoas teoricamente teriam de estar se dedicando a encher a barriga, e os corações, com pratos típicos da gastronomia brasileira, todos estavam ali se amontoando na enorme fila para resolver pendências.

Sortuda que sou, precisava apenas falar com a gerente da minha conta. Para minha surpresa, a porta não tinha detector de metais e passei tranquilamente por ela. Sentei na poltrona para esperar ser atendida e, quando olho para a porta, vejo dois rapazes serem barrados pelo segurança.

Ambos eram afrodescendentes, estavam com o uniforme da maior companhia de manutenção de elevadores do País e, por conta do trabalho, os trajes tinham graxa por todos os lados. A cena me causou certa revolta. Fiquei pensando em como o trabalhador brasileiro tem que aguentar uma rotina estressante em uma cidade como São Paulo e ainda ser discriminado na entrada do banco.

Para piorar, eles sentaram ao meu lado e estabeleceram o seguinte diálogo:
- Quanto tempo esse pessoal de banco vai levar para entender que quem quer roubar não passa pela porta? – perguntou o primeiro.
- Se o cara quer entrar pra roubar, vem vestido de executivo, arrumadinho, com terno – constatou o segundo
- Ainda dá tchau para a câmera – apostou o primeiro

Com o estômago roncando, o primeiro perguntou?
- Será que a gerente vai demorar muito? Eu estou com uma fome.
- Saindo daqui, almoçamos um cheesesalada aí na frente.
Por Vivian Peres

sexta-feira, 29 de maio de 2009

O almoço do brasileiro (parte I): A jornada se reduz

Sempre me perguntei como é possível desenvolver uma boa alimentação diária tendo que sair do trabalho, entrar na fila do restaurante, servir-se, almoçar, pedir a sobremesa, pagar a conta e estar a postos para a jornada vespertina em apenas uma hora.

Há alguns anos, o intervalo de almoço era o dobro desse tempo e alguns felizardos podiam ainda voltar para casa, assistir a um pedacinho do jornal e fazer a sesta – que por sinal aumenta a qualidade do desempenho laboral e faz bem ao coração, à mente e ao corpo.

              

Em uma cidade como São Paulo, os próprios colaboradores optam por reduzir o intervalo de realização da principal refeição do dia. Uma análise simples pode levar a dois motivos aparente: passe-se mais tempo no trânsito, sendo preciso reduzi-lo em outras áreas, e, como sempre, a influência do modelo de gestão norte-americano.

Cada vez mais e mais, as escolas de negócios seguem a cartilha do Tio Sam, ensinando o modelo de business ditado pelos nossos vizinhos, no qual a regra básica é: menos é mais. Ou seja, menos almoço é mais trabalho. Com hábitos alimentares alijados por todo o mundo e reconhecidamente pouco saudáveis, o norte-americano típico nem sai do escritório para comer, prefere fazer isso na própria mesa.

Não é coincidência que almoço, em inglês, é lunch. Ou seria lanche? Na cultura deles, a fome é perfeitamente saciada com um sanduíche de pasta de amendoim com geleia. Felizmente, na nossa, um belo prato de arroz com feijão ainda é muito valorizado, porém, um dia, pode deixar de ser.

Mas pior do que ter de enfrentar a fila do restaurante, é ter de gastar a sagrada hora do almoço para resolver pendências burocráticas e depois ainda ter de se contentar em comer um misto-quente.

A parte II desta trilogia traz uma descrição reveladora de como pode ser triste o momento em que um brasileiro típico deveria estar almoçando.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Milionários sem casa


Como um filme pode arrecadar U$S 262 milhões e parte de seu elenco continuar vivendo em situação de extrema pobreza, sem casa e com pouquíssima comida? Esse é o retrato da situação em que vivem os atores mirins de “Quem quer ser um milionário?”, película que arrematou nada menos do que oito estatuetas do Oscar.

Após o sucesso, nada mudou na vida dos atores Rubina Ali e Azharuddin Ismail M. Shaikh, que interpretaram respectivamente os personagens Latika e Salim crianças. Além de continuarem vivendo em uma favela de Mumbai – o slum, que deu nome ao título original Slumdog Milionaire –, perderam as casas graças a uma demolição oficial, que incluiu as habitações em estado precário.

Em meio a galinhas que podem virar jantar e esgoto a céu aberto, sem higiene, nem saneamento, vivem amontoados em habitações pequenas, sobrevivendo da ajuda de familiares. O produtores do longa explicam que foi dado um alto cachê às crianças, porém, devido às leis indianas, o dinheiro só poderá ser usado quando elas completarem a maioridade.

Pode parecer um pensamento simplista, mas a pergunta é: não há nenhuma brecha na lei, como, por exemplo, fazer uma doação espontânea em dinheiro à família dos atores? Com certeza, nenhuma lei impede os produtores de conseguirem empregos bem remunerados para os pais dos pequenos, o que poderia ser outra solução.

O filme, que eu considerava um dos roteiros mais bem amarrado dos últimos tempos e uma das premiações mais inteligentes da academia, perde fãs. Mostra que a crítica artística é importante para a reflexão e deve ser feita, sempre. Mas só há significado real e profundo quando existe coerência entre discurso e ação.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Neurose do porco

Há algum tempo, entrevistei o médico psiquiatra Isaac Efraim. Especialista em fobias e distúrbios ligados à ansiedade e ao medo, explicou algo que hoje parece até um tanto quanto óbvio: o medo é uma ansiedade extrema. A ex-gripe suína, que agora é chamada de Gripe A (H1N1), é uma prova latente de que o descontrole emocional contemporâneo causa pânico generalizado.

Por exemplo: apesar de já estar claro que a gripe não é tão perigosa e da Organização Mundial de Saúde (OMS) confirmar que o consumo de carne cozida não transmite o vírus, os suínos já registram quedas nas vendas globais.

O frigorífico JBS-Friboi, gigante do setor presente em 18 países, comenta que China, Rússia, Coreia do Sul, Indonésia e Tailândia embargaram os produtos originários dos Estados Unidos e do México. No Brasil, mesmo com poucos casos confirmados, em alguns estados, como Goiás, as quedas nas vendas desse alimento chegam a 60%, de acordo com dados do Sindicato Varejista de Carne Fresca (Sindiaçougue).

Tudo isso aponta ansiedade endêmica causando verdadeira globalização da hipocondria: pessoas comprando remédios preventivos, máscaras por toda parte, produtos portáteis de higienização, etc.

Mas um fato chama ainda mais a atenção para a loucura geral: nos Estados Unidos, estão sendo organizadas festas para contrair a doença.

Pode parecer um contrassenso, mas a ideia de quem participa é que devem pegar a gripe agora, enquanto o vírus é “fraco”, preparando, assim, o sistema imunológico para uma possível mutação que torne a doença mais letal. Cientistas garantem que a precaução não tem “pé nem cabeça”.

As pessoas estão tentando se prevenir de algo que nem sabe se vai acontecer, contraindo um vírus poucos conhecido, que age no corpo de cada pessoa de maneira imprevisível. Entre uma bebidinha e outra no copo alheio, em meio a quitutes e hot dogs, sai uma rodada de gripe do porco.

Impossível não se lembrar da explicação de Efraim sobre o medo, pois os níveis de ansiedade mundiais estão cada vez mais intensos. Isso sim é pandemia!

PS: E o Ministro da Agricultura diz que, caso as exportações de suínos caíam, vai convidar o presidente Lula para comer porco no rolete. Tudo para provar que pode!

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Obama e a gastronomia

Tudo o que Barack Obama faz vira notícia. Natural para o homem mais poderoso do mundo. Mas a imprensa norte-americana tem verdadeira obsessão pelo cardápio presidencial. Basta o presidente experimentar qualquer prato que saia do protocolo e a informação vira notícia internacional. A rede televisiva CNN noticiou no último domingo (10 de maio) duas escapulidas do líder.

A primeira foi uma tentativa de ficar a sós com a esposa Michelle. Segundo a reportagem, antes de virarem o primeiro casal da América, os Obama costumavam “namorar” pelo menos uma vez por semana. Durante os cem primeiros dias na presidência, não conseguiram manter a tradição. Resolveram, então, agendar uma noite romântica, dia 4 de maio, no badaladíssimo restaurante Citronelle, do chef Michel Richard (fotos), no charmoso bairro de Georgetown.

O local é reconhecido como o melhor estabelecimento da capital federal e ironicamente foi um dos restaurantes retratados no filme “Uma noite com o presidente”.

Ao chegarem havia mais de 200 pessoas na porta, além de 30 jornalistas. Mesmo assim, mantiveram os planos, sentaram em uma mesa reservada e pediram dois dry martinis. Ele comeu costelinhas, ela hambúrguer de lagosta. Detalhe para ser aprendido no Brasil: a conta, de 200 dólares, foi paga com cartão pessoal do presidente. Michele ainda distribuiu beijinhos ao chef.

O segundo fato noticiado exaustivamente foi a ida do presidente, juntamente com o vice Joe Biden, à lanchonete Ray's Hell Burger, um estabelecimento comum, em Arlington, na Virginia. O primeiro pediu sanduíche de cheddar e o segundo, cheeseburger. Qual é a novidade nisso?

Realmente, cada vez mais acredito que a comida tem verdadeiro poder político, unificando as pessoas e causando automática identificação dos homens públicos com a massa. Alguém duvida?

E por falar em Obama... Com a renovação da Casa Branca, Washington entrou para a mira da revista People. Famosa por noticiar fatos envolvendo celebridades, a publicação faz periodicamente o ranking das 100 pessoas mais bonitas do mundo. Neste ano, destacou beldades do novo governo. A lista inclui o secretário do tesouro Timothy Geithner, o chef de cozinha oficial Sam Kass e, é claro, a primeira-dama Michele.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Jantar chique com o dinheiro alheio

Acho que nem é preciso dizer que a verba indenizatória de R$ 2,2 milhões gasta no primeiro semestre deste ano pelos senadores nacionais inclui abusos relacionados à alimentação que vão do cafezinho do gabinete a despesas em restaurantes para “reuniões políticas”.

Afinal, como o dinheiro é liberado mediante apresentação de nota-fiscal, elas acabam vindo das mais diferentes fontes. Gastos com locomoção, alimentação, hospedagem, combustíveis e lubrificantes são os preferidos.

O líder dos tucanos na casa, senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), ainda admitiu ter dúvidas quando à utilização um tanto quanto “gastronômica” do dinheiro público, informa a organização Transparência Brasil: “Por conta da falta de regulamentação, era tudo muito vago. Eu me questionava: posso pedir o ressarcimento dos gastos em um jantar com prefeitos?”, disse o parlamentar.

O pior detalhe é que o contribuinte não possui o direito de saber quanto e onde cada senador usou especificamente a verba. Em outras palavras, eles podem levar quem quiserem ao restaurante que bem entenderem e nenhum eleitor vai ficar sabendo. Isso é Brasil!

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Meia Berlusconi, meia... Napolitano



Ao ouvir falar em Napolitano, acredito que a primeira coisa que vem à cabeça de quase todos os indivíduos brasileiros é comida. Mais especificamente a pizza ou o sorvete sortido com chocolate, creme e morango. Perfeitamente compreensível!

Uma pequena parte lembrará que napolitano é um indivíduo nascido na cidade italiana de Nápoles, segunda maior região metropolitana daquele país e principal expoente da região Sul. Não é por coincidência que ainda é a cidade natal da pizza, onde se pode comer os melhores pratos deste quitute.

Agora, são poucos os que pensam em Giorgio: o Chefe de Estado italiano, que leva Napolitano no sobrenome e é constantemente ofuscado pelas trabalhadas do Chefe de Governo, Silvio Berlusconi. Tendo o magnata das comunicações como primeiro ministro, o país europeu precisa ter cuidado para manter as tradições democráticas e garantir a credibilidade das principais instituições.

Cabe exatamente a Napolitano – que é realmente procedente de Nápoles – a principal tarefa em meio a tudo isso: salvaguardar a Constituição, que, com sessenta anos de existência, é uma das mais consolidadas da Europa. Constantemente, Berlusconi diz que inúmeros itens da carta travam a sua governabilidade, limitando poderes.

Mas não é essa a finalidade de uma Constituição, limitar abusos e garantir o processo democrático? Para driblar essas amarras, o chefe de governo investe em decretos-lei, uma versão italiana das nossas Medidas Provisórias. O chefe de estado tenta brecá-lo a todo custo.

Com 82 anos e histórico político invejável, Napolitano foi eleito presidente em 2006, com apoio da centro-esquerda italiana. Ex-membro do Partido Comunista Italiano (PCI), o político parece ter como sina combater os fascistas, tanto os do século XX, quanto o do século XXI.

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PS: Dizem as más línguas que verdadeira pizza napolitana leva apenas tomate, azeite de oliva, orégano e alho.

terça-feira, 14 de abril de 2009

A crise e o vendedor de biju

Há alguns meses, passando pela esquina da Rua Oscar Freire com a Avenida Rebouças, ouvi o vendedor de biju – que, por sinal, também diversifica os negócios comercializando amendoim torrado – reclamar da crise. Ele dizia que, durante o mês de janeiro, verificou uma forte queda nas vendas.

Muito informado, automaticamente atribuiu o fato aos problemas enfrentados pelas economias internacionais, como os Estados Unidos.
Passei meses me questionando de que maneira essas questões poderiam realmente afetar alguém que comercializa um produto tão barato em um dos pontos de venda mais nobres da cidade de São Paulo. Como um consumidor em potencial que transita por esse local poderia deixar de comprar biju por conta da crise? Será que as pessoas compensariam as perdas em ações com a compra do amendoim torrado?

Admito que até agora não achei uma resposta suficientemente plausível.

Mas levantei algumas hipóteses bastante peculiares, lá vão:

- Com o aumento do desemprego, a informalidade cresceu e fez com que mais pessoas vendam biju e amendoim nas esquinas de São Paulo. Tornando o mercado mais agressivo.

- Apavorados com a crise e com medo de gastar demais, os indivíduos deixaram de carregar dinheiro vivo no bolso para não caírem em tentação.

- Com as dificuldades para pagar o financiamento de veículos, menos paulistanos estão passando naquela esquina de carro.

- O tiozinho do biju está usando a crise internacional como desculpa por vender menos no período de férias.

- O brasileiro não come biju nem amendoim quando está com medo de perder o emprego!

Mais alguma ideia?

terça-feira, 7 de abril de 2009

Novo conceito de hora feliz



Dia desses, uma amiga querida, com irmã na faixa dos 20 e poucos anos, contou-me uma história engraçada. Em plena sexta-feira, antes de sair para encontrar a galera no bar, viu a irmã tomando uma latinha de cerveja em frente ao computador. Rapidamente, perguntou: “Por que está aí sozinha?”. E obteve a seguinte resposta: “Estou fazendo uma happy hour com os meus amigos do MSN”.

O fato simboliza muito bem os novos ares da era da informação.

A vida virtual é, cada vez mais, uma forma imprescindível de socialização, um instrumento para formar a famosa networking. Nas aulas de marketing estratégico do MBA que curso, falamos muito menos de teorias e muito mais das formas como podemos aplicar a internet para incrementar os negócios, fazendo uso dos sites de relacionamento para conhecer pessoas.

Os mais velhos se preocupam em entrar na onda e querem se informar para não fazer feio, nem parecerem pessoas obsoletas. Os mais novos nasceram com a veia da tecnologia, aquela que ninguém tira. Outro dia, no elevador do mesmo MBA, vi uma menina ensinando à outra como usar o Twitter e as vantagens que o site oferece. No final, disse brincando: “se quiser, viro sua personal twittator tabajara”.

O interesse é tanto que o site foi capa da Época. Hoje, o The New York Times fala sobre o Facebook, focando em como ele se tornou um negócio lucrativo, mas com alguns problemas.

Será que vai chegar um dia em que todas as happy hours realmente vão ser pelo MSN, como já vislumbra a irmã da minha amiga? Espero enormemente que não, afinal, é impossível passar uma picanha no réchaud pela tela e nada substitui um bom petisco, ou o chopp gelado tirado na hora.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Chocolate para abrandar a crise


Na semana passada, li duas notícias que foram feitas para esse blog. A primeira saiu no The New York Times e contava que, cada vez mais, os norte-americanos evitam pagar a conta quando saem para comer com os amigos ou parceiros de negócios. A segunda era da Agência Reuters e dizia que, pós-crise, aumentou enormemente o consumo de doces na terra do Tio Sam.

Acho que os motivos dos dois fartos são bastante evidentes. Quem já saiu para comer nos Estados Unidos sabe o quando é caro frequentar qualquer restaurante que ofereça gastronomia de qualidade, com ingredientes frescos e selecionados. Se você não quer levar seu convidado ao McDonald’s ou ao Taco Bell's, realmente tem que investir.

Já o consumo de doces tem a ver com uma palavrinha simples: serotonina. A substância que relaxa e produz tranquilidade e alegria.
Afinal, e tempos de crise internacional, nada como um bom pedacinho de chocolate para alegrar. E que venha a Páscoa!

quinta-feira, 19 de março de 2009

Comemoração do dia!

Acabei de ler uma notícia sensacional no New York Times: A Câmara norte-americana aprovou por 328, contra 93, uma taxação de 90% sobre os bônus pagos para executivos de empresas em “salvamento”. Não tenho grande simpatia pelos EUA, mas tenho que tirar o chapéu, pois foi uma saída de mestre! Desta forma, 90% do que for pago aos executivos da AIG será devolvido aos cofres públicos. Agora, o projeto precisa da aprovação do senado, o que deve acontecer rapidamente.

Se fosse no Brasil, a votação só terminaria ao final da crise.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Cassação e fome

Pela primeira vez na história, um ditador em exercício foi punido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI). Seria um fato pouquíssimo questionável por qualquer defensor da democracia não fosse um pequeno detalhe: ele é líder da República do Sudão, um dos países mais pobres e conflituosos da África. Será que se fosse líder de uma nação com alguma relevância econômica internacional – como tantos outros ditadores espalhados por aí – teria recebido o mesmo tratamento?

De qualquer forma, é claro que a punição a um ditador como Omar Hassan al-Bashir, que chegou ao poder por meio de golpe de estado, merece muitas comemorações – fogos do artifício até. O presidente foi condenado por crimes de guerra, genocídio e crime contra a humanidade, graças a conflito que se estende desde 2003 na região sudanesa de Darfur.

Enquanto o TPI estuda ainda como impor a sanção ao ditador - o que é complicado em muitos pontos, podendo ferir a soberania do Sudão - a população do maior país africano continua definhando. Desde que os primeiros conflitos sudaneses começaram – há aproximadamente quatro décadas – calcula-se que 1,5 milhões de pessoas já tenham sido vitimadas, segundo estatísticas da ONU.

Deste montante, há uma parcela que morre em decorrência direta da luta armada, mas, grande parte padece de um mal que mata lenta e dolorosamente: a fome. Falta todo tipo de alimento no local. O conflito não permite que haja produção de alimento, nem que eles sejam entregues, o que torna comida fornecida pelos organismos internacionais insuficiente.

Resultado: todas as crianças têm pouco peso e a maioria delas atinge estágios irreversíveis de desnutrição. Cada dia representa uma guerra diária para fazer alguma refeição.

Apesar de todos esses problemas, é de se estranhar que o Sudão apareça tão pouco na mídia, brasileira ou mundial. Mesmo com a cassação do presidente, fato de extrema relevância para a história do TPI, houve repercussão irrisória nos grandes meios. A mídia perde, o mundo perde e, principalmente, o Sudão perde.
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PS: Com essa luz do fim do túnel, é de se esperar que outros ditadores também sejam punidos e afastados do cargo. Tomara.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Rabada com polenta: patrimônio nacional

O prato predileto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo ele mesmo, é rabada com polenta. Completamente previsível e bastante emblemático. Mesmo que Lula fosse apaixonado por Foie Gras, com Creme Burleé para sobremesa, jamais reconheceria em público e comeria em alguma sala arquisecreta da Granja do Torto. Afinal, como homem carismático com rompantes populistas que é, Lula certamente sabe que a gastronomia é um ponto que consegue unir pessoas, com a mesma força que as separa – aliás, é exatamente por isso que esse blog existe.

Já inventaram, até mesmo, um termo denominado “Comfort Food” para determinar, por exemplo, aquela sensação com a qual nos deparamos ao cheirar um tempero que remeta às raízes, à casa da mãe ou da avó, à merenda do colégio – claro que isso só acontece quando todos esses itens trazem boas lembranças. Quando um presidente brasileiro diz que, entre todas as comidas do mundo, escolhe rabada com polenta, mostra-se alinhado com as bases demográficas do País, em consonância com as origens pernambucanas e se torna, assim, um homem do povo. De bobo, não tem nem o cardápio do almoço.

Coincidência ou não, de uns tempos para cá, comer rabada é Cult. Bons restaurantes de São Paulo servem o prato e há até “bibocas” que se tornam rapidamente pontos “descolados” por oferecer boas versões a preços módicos. Além disso, não se pode negar a contribuição do chef Alex Atala, que, depois de ser reconhecido internacionalmente, ganhou passe livre para ditar tendências e mostrar a um povo que pouco valoriza as suas raízes culturais o quanto elas são ricas e especiais.

Mais que um prato, a rabada com polenta é a expressão de uma cultura, que, cada vez mais, deixa de ser marginalizada para entrar no circuito oficial.

PIMENTA: Como também não era bobo, quando presidente, Fernando Henrique Cardoso declarava que seu prato predileto era picadinho. Essa era um pouco mais difícil de acreditar.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Oligarcas maranhenses

As comidas típicas do Maranhão refletem as raízes de um dos estados brasileiros que mais se assemelha ainda a uma capitania hereditária. Misturando influências dos sertanejos, índios, portugueses e africanos, a gastronomia é muito rica. Entre os pratos procedentes da primeira origem, estão: carne-de-sol com aipim, galinha caipira, peixada e pato guisado.

Mas realmente são os escravos africanos que mais colaboraram para a formação de receitas criativas e saborosas, que agregam misturas até então inusitadas. O principal expoente é arroz-de-cuxá (foto), uma mistura de camarão fresco, camarão seco, vinagreira (verdura típica da região), arroz e temperos. As raízes que ajudaram a criar essas iguarias gastronômicas são as mesmas que até hoje mantém o estado maranhense impregnado por escravidão e sofrimento. Compõe-se assim uma população alijada, com baixa escolaridade, que acaba mantendo os mesmos comandantes oligárquicos no poder.

Em outras palavras: é um dos maiores grotões brasileiros. A família Sarney manda e desmanda como se fosse dona do estado. E de fato é. Os Sarneys possuem quatro emissoras de TV, o maior jornal impresso, 14 emissoras de rádio, uma ilha e diversas propriedades, além de governar o Maranhão há 42 anos, com políticos da família ou títeres comandados por ela.

A influência dos oligarcas no estado tem origens históricas: começaram como intermediários das aplicações de verbas da Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) e, posteriormente, da Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). O mais irônico é que essas entidades, que foram criadas para diminuir a disparidade entre os estados do Norte e Nordeste e as demais regiões do País, tornaram-se as maiores fontes de desigualdade, alimentando as elites locais com altíssimas quantias.

Depois de muitos anos de supremacia maranhense, Roseana Sarney (PMDB) perdeu a última eleição ao governo para Jackson Lago (PDT). Porém, como a família sempre dá um “jeitinho brasileiro”, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato do político eleito democraticamente pelo povo e, segundo a lei, deve nomear o segundo colocado para o cargo, ou seja, exatamente a Roseana. Os motivos da cassação são abuso do poder econômico e político, incluindo diversas denúncias que, pelo menos por enquanto, parecem um pouco vagas. É o caso, por exemplo, dos eleitores que denunciaram compras de votos espontaneamente - depois, inclusive, um deles voltou atrás e disse que tinha recebido dinheiro para testemunhar.

As consequências recaem exatamente sobre a massa afrodescendente do estado, os inventores do arroz-de-cuxá e verdadeiros chefs de cozinha para ninguém botar defeito. Enquanto as oligarquias não saírem do poder, o quadro futuro continua bem sombrio.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Glamour X realidade


No carnaval, pisei pela primeira vez em terras portenhas. Já conhecia a Argentina, devido a uma viagem para Bariloche, mas vivi a minha primeira visita a Buenos Aires. Antes de viajar, ouvi de grande número de pessoas que conheciam o local frases como: “vá para Puerto Madero, é um luxo”; “visite o shopping da Recoleta, é maravilhoso”; “a Calle Florida é uma perdição de compras”; “Palermo é puro glamour”; “ir para Buenos Aires é como respirar ares europeus”.

Antes de mais nada, quero dizer que amei a viagem, fiquei completamente encantada com a cidade e quero voltar, com certeza. Mas o que eu vi em Buenos Aires, com olhos mais críticos e menos embaçados pelas belezas do tango, foi uma cidade sulamericana com um leque tão grande de problemas que precisam de mais do que os dedos das duas mãos para serem enumerados.

Como povo consciente que são, os portenhos exibem um semblante repleto de medo e preocupação. Justo quando a economia do país começava a se recuperar após inúmeros baques, veio esta crise internacional, que tem feito a economia degringolar. Além disso, todos os cidadãos com quem conversei reclamavam da má conservação da cidade, com lixo acumulado em todas as esquinas, aumento da violência em diversos bairros, táxis caindo aos pedaços, trânsito caótico, etc.

Mesmo os restaurantes sofriam com a falta de manutenção, que influencia até na percepção de higiene. Já os famosos prédios históricos com arquitetura de estilo europeu precisam de um melhor plano de conservação e restauração. Parênteses: o famoso Teatro Colón já está sendo renovado.

O trem do metrô (subte) que leva à Plaza de Mayo é o mais antigo da América Latina e continua sendo o mesmo inaugurado em 1913. Claro que isso fornece um ar completamente especial ao local, até mesmo exótico, mas nada agradável às seis horas da tarde, quando os vagões lotam de uma maneira absurda, bem semelhante ao que acontece em São Paulo no mesmo horário. Com a diferença que, segundo denúncias públicas, o serviço portenho de metrô chega a ser perigoso de tão sucateado: faltam extintores de incêndio, mapas de evacuação e saídas de emergência.

Enfim, o fato é que, com o charme de Buenos Aires, para acalmar os ânimos depois da experiência do subte lotado, é possível tomar um sorvete Munchi de super doce de leite. Com certeza, o melhor do mundo! Certos sacrifícios valem à pena.

terça-feira, 3 de março de 2009

Bife de chorizo: reflexo da Argentina

Visitar outro país obrigatoriamente deve incluir fortes experiências gastronômicas, que podem variar entre extremamente agradáveis e bastante complicadas, seja para o paladar, para o corpo ou para o bolso. De uma maneira ou de outra, entrar em contato com um sabor inusitado é sempre inesquecível, para o bem ou para o mal. Na Argentina, a gastronomia de um modo geral revela muitos prazeres. Em Buenos Aires, a expressão máxima é realmente o famoso bife de chorizo, uma especialidade local que assume múltiplos sabores dependendo do estabelecimento que a prepara.

Dizem que, para o padrão brasileiro, o bife de chorizo seria equivalente a uma parte mais selecionada do contrafilé. O fato é que o corte argentino transforma o pedaço de carne tradicional em um bife tenro com sabor inigualável. E o segredo da preparação é simples: não deixar passar do ponto. O tempero? Sal grosso.

O prato é a prova de que os sabores portenhos continuam os mesmos, deliciosos e inigualáveis, mas uma coisa mudou radicalmente nos últimos anos: os preços. Desde que os brasileiros começaram a descobrir Buenos Aires, há aproximadamente dez anos quando a moeda argentina se desvalorizou após a catástrofe econômica do governo Menem, visitar a cidade significava obter vantagens ilimitadas o tempo todo. Tudo era uma pechincha!

Há poucos anos (quatro ou cinco) – segundo contaram pessoas consultadas que visitaram o país neste período – era possível gastar 15 pesos para comprar uma refeição completa, que incluía, sim, o bife de chorizo e até uma deliciosa taça de vinho da casa. Hoje, a iguaria não sai por menos de 40 pesos, operando com uma média de 60. Detalhe que o cafezinho pode chegar a 10 pesos, custando, em média 5, nas principais casas da cidade.

Pode-se pensar em uma junção de valores para um crescimento tão exacerbado dos preços dos alimentos na capital argentina. Em 2008, por exemplo, o índice de inflação oficial do país vizinho, divulgado pelo Instituto Nacional de Estadística y Censos (INDEC), foi de 7,2% - e 8,6% em 2007 -, mas calcula-se que a inflação real chegue a mais que o triplo (24%). Se pensarmos que esses aumentos nos preços são influenciados primordialmente pela alta das commodities, é possível perceber claramente por que um bife de chorizo praticamente triplicou de valor.

Para o turista, os reflexos são mínimos. Afinal, os gastos extras de uma viagem internacional devem estar previstos no orçamento. Porém, o problema maior é para os próprios portenhos, que vêem, a cada dia, o seu poder de consumo encolher, incluindo a famosa iguaria local. A atual crise só tende a piorar esse quadro.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

De outros carnavais

Um lugar onde o deus Baco, ou Dionísio, se sentiria lisonjeado, representado e honrado. Assim é a cidade de Bento Gonçalves (RS), onde acontece, até dia 24 de fevereiro, a Fenavinho – Festa e Feira Nacional do Vinho. O evento concentra 120 vinícolas de diversas regiões do Brasil. As estimativas são de que 120 mil pessoas devam passar pelo local até a terça-feira de carnaval.

Vendo um evento deste porte, com alto grau de profissionalismo e organização, não se pode deixar de pensar na diversidade brasileira: são vários países em um só. Na região do Vale dos Vinhedos, uma das únicas áreas demarcadas de vinhos reconhecidas pela União Europeia na América do Sul, amanhã não é uma data especial porque começa o carnaval. Pelo contrário, é um momento mais do que sagrado: época de colheita da uva.

Não haverá trios elétricos, axé, samba, funk ou qualquer outra expressão da cultura popular carnavalesca brasileira. Mas sim trabalho árduo em torno de uma verdadeira paixão, e necessidade econômica, da região: fazer bons vinhos, honrando a memória de Baco.

Vinícolas como Grupo Domno Brasil, Salton, Miolo, Lídio Carraro e Aurora estarão a todo vapor, enquanto os foliões se amontoam pelas ruas de Salvador, Recife, Olinda, entre tantas outras cidades nordestinas. Viva a diversidade!

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Na foto, a fonte de vinho que abre a feira.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Comida, diversão, arte e... educação

Só se faz um país com um sistema educacional de qualidade. Essa ideia, apesar de altamente clichê, deve ser constantemente repetida, pois não é relembrada. Nos últimos dias, mais exemplos e fatos mostraram que a educação brasileira vai de mal a pior.

Vários, e complexos, fatores guiam um país rumo a um sistema educacional eficiente, que consiga formar uma massa crítica e lançar profissionais de qualidade no mercado de trabalho. Entre eles, está a formação e atualização dos professores, a infra-estrutura das escolas e, em grande parte, a alimentação dos alunos. Sim, a comida servida. Criança que come mal apresenta grande dificuldade de aprendizado. Não é preciso ser nenhum gênio para entender por que.

Por isso, entre todas as notícias apresentadas recentemente sobre educação, assustei-me com a fraude da merenda escolar. Mesmo essa notícia não é novidade: em 2003, em Fortaleza e em 2007, no Maranhão – coincidentemente o estado do novo presidente do Senado – houve denúncias de superfaturamento, compra ilícita e terceirização de merenda. As crianças chegaram a ficar sem ter o que comer. Agora, acontece em São Paulo e também em Cotia: comida estragada e quantidades ínfimas de alimentos são distribuídas. Em 2007, a SP Alimentos já havia sido acusada de oferecer propina para conseguir a licitação. O problema é endêmico.

Onde está o poder público e a imprensa – que inicialmente noticiou o fato com grande enfoque e agora já o tirou da mídia?

Outro fato alarmante foi o nível dos professores avaliado por uma prova realizada pela Secretaria Estadual da Educação de São Paulo, segundo informações da coluna de Gilberto Dimenstein desta quarta-feira, na Folha de São Paulo. 40% dos 48 mil alfabetizadores avaliados seriam reprovados com nota menor do que cinco. Três mil tiraram zero!

A pergunta que fica é: se todo mundo sabe o que deve ser feito, por que tão poucos fazem? Um dos principais motivos dos governantes para não investir no setor é óbvio: demora a haver retorno, a melhora do ensino não é palpável e visível, como fazer uma ponte, por exemplo. Além disso, na construção civil, é mais fácil superfaturar, desviar, realizar atos ilícitos...
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Sexta-feira 13
Depois de Temer e Sarney, tivemos uma semana de Edmar, de Yeda, de dois acidentes de avião e o caso Eluana Englaro. Desculpem-me todos os religiosos e dogmáticos que foram contra a autanásia da italiana, mas a jovem já não tinha vida há muito tempo. Basta pensar na comida. Sabe o que Eluana comeu nos últimos 17 anos, que alimentos ingeriu? Nada, nenhum! É difícil imaginar o corpo de uma italiana que não consumiu nem um pratinho de macarrão em todo esse tempo. Por mais que estivesse recebendo todos os nutrientes necessários, a jovem já pesava menos de 40 quilos.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Zac Efron ou João Pedro Stedile

Quando entrei na faculdade, há exatos dez anos, o MST (Movimento Sem Terra) era a High School Musical do corpo discente - e do docente em grande parte – da universidade pública, ganhando status de celebridade. Hoje, vindo ao trabalho, li a reportagem “Frente a frente”, de Phydia de Athayde, na Carta Capital, sobre as atuações mais recentes do movimento, e me perguntei: o que mudou tanto de lá para cá?

A resposta é: tudo. Eu mudei, a sociedade mudou, a universidade idem, o País mudou e, acima de tudo, o MST mudou. E muito! Em finais da década de 1990, a sigla significava esperança para a população de um modo geral. Exemplo de que era possível se organizar em busca de um objetivo comum e combater as grandes injustiças que assolam o País, como a concentração fundiária.

Visitar o acampamento do MST na saída de Bauru era quase lição de casa para quem fizesse um curso de humanas no campus da Unesp na cidade. Lembro-me de olhar o chão de barro batido, as tendas de lona preta e as crianças brincando felizes com pés cobertos da fina terra vermelha. Mas, acima de tudo, recordo-me do cheiro da comida, requentada em marmitas de alumínio em pequenos fogões de camping. O menu incluía arroz com feijão ralo, macarrão e ovo frito. Tudo junto e misturado.

Acreditem: tinha gente da minha sala, pessoas com teto, universitários, que moravam lá com eles, no acampamento, tamanho o fascínio que causavam.

Hoje, como mostra a matéria da Carta Capital, o MST vive de tentar fazer a vida do gerente-geral da Vale, José Rogério de Paula e Silva, um inferno. O líder do movimento, João Pedro Stedile, responde a diversos inquéritos criminais na justiça e tem, por trás dele, uma ampla gama de advogados gabaritados, que, certamente, almoçam em bons restaurantes. Nada semelhante à legitimidade das bases do movimento no final do século passado.

Só me pergunto o que estão fazendo aquelas crianças, hoje adultos, que corriam pela terra batida no calor de Bauru. Desertaram do movimento? Conseguiram seu pedaço de terra? Tentaram a vida marginal em uma grande cidade? Questionamentos que dificilmente serão respondidos.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Bolo econômico


O ministro da Fazenda, Guido Mantega, o ex-ministro Antonio Delfim Netto e o economista Luiz Gonzaga Belluzzo encontram-se quinzenalmente para aliar duas paixões: discutir economia e experimentar alta gastronomia. Fato corriqueiro entre amigos, mas que, em se tratando dos nomes em questão, pode ter consequências que afetam o futuro do País, o meu e o seu.

Na última semana, o estabelecimento escolhido para sediar a reunião foi o restaurante Massimo, localizado na Alameda Santos, em São Paulo. A escolha é um tanto óbvia. O estabelecimento é queridinho na elite paulistana, oferece comida italiana de qualidade e só. Em outras palavras: nada que justifique os preços exorbitantes.

O local pertence aos irmãos piemonteses Massimo e Venanzio Ferrari e possui receitas que são segredos de família mantidos por mais de 50 anos. Entre os pratos de destaque, estão: costeleta de cabrito, grelhado dos pescadores ou espaguete ao catoccio. Eu chutaria que Delfim pediu o primeiro. Para acompanhar, um bom vinho italiano que vale tanto quando uma família recebe por mês do bolsa família.

A pauta certamente envolve, entre outras questões, a maneira como a crise financeira internacional atinge o Brasil durante este ano. Afinal, o ministro finalmente reconheceu que o “descolamento” que pregava – grosso modo, pode ser traduzido como a crença de que a economia nacional estava fortalecida e seria menos afetada – não aconteceu.

Leio o que Delfim tem a dizer às quartas-feiras na Folha de São Paulo, porém, a vertente moderna não me convence. Sempre alio a imagem dele ao homem que queria fazer o bolo da economia crescer para depois dividi-lo. Já Beluzzo trabalhou para Sarney e Quércia. Ultimamente, faz de tudo um pouco: preside o Palmeiras e dá consultorias econômicas ao presidente Lula. Faz parte do conselho diretor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, onde estudei.

Imagino que as soluções encontradas sejam tão ortodoxas quanto o restaurante escolhido. Quem perde é a economia brasileira, que deve continuar encolhendo, enquanto as altas taxas de juros são cortadas em patamares ínfimos.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Marias Antonietas brasileiras

“Se não tem pão, que comam brioches”. A famosa frase atribuída a Maria Antonieta – não se sabe ao certo se foi dita por ela, mas sem dúvidas poderia ter sido – entrou para a história por representar a ostentação em meio à pobreza, tocando, além de tudo, no direito mais básico de todo ser-humano: fazer, no mínimo, três refeições diárias. Infelizmente, o Brasil, assim como tantos outros países com números alarmantes de desigualdade social, está lotado de Marias Antonietas.

Duas delas me chocaram nos últimos dias.

A primeira e a governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB). Em meio a turbulências internacionais, corte de cargos, anúncio de que o PIB do Brasil pode crescer míseros 0,5% em 2009 e até catástrofes causadas pela chuva no estado que administra, a tucana resolveu encomendar um “aviãozinho” de 26 milhões de dólares. Acho que nem é preciso dizer mais nada.

A segunda é uma singela elefanta cor-de-rosa: a casa noturna Pink Elephant, que foi recentemente inaugurada em São Paulo. Importado, o estabelecimento é nova-iorquino, com duas casas por lá, possui ainda uma sucursal em Utah, outra na Riviera francesa e São Paulo, no Jardim Europa!

Estima-se que a unidade brasileira custou aproximadamente 4 milhões de reais, segundo fontes não oficiais, e conta com pequenos “mimos”, como duas garçonetes por mesa e um banheiro com produtos Dior, exclusivo para convidados VIP. A capital paulista é realmente uma cidade elitista, sem capacidade para perceber que ostentar, especialmente em um país como o Brasil, não é chique.

O estilo Maria Antonieta está sempre em alta em terras tupiniquins. Ícones são ícones. Os brioches estão aí para comprovar.

PS: quer comer um bom brioche em São Paulo? Experimente a Mercearia do Francês.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Jockey, luxo e dívida de IPTU


Primeiro, a Daslu. Agora, o Jockey. Parece que dar calote em impostos virou uma prática comum, e necessária, entre os ícones de poder e luxo da cidade de São Paulo. O Jockey Club deve a bagatela de 180 milhões de reais de IPTU para a prefeitura paulistana, segundo a coluna de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo deste domingo.

Qualquer empresário conhece o preço dos impostos, o quanto é complicado manter um negócio no Brasil por causa deles. Mas não pagá-los pode representar suicídio para micro ou pequena empresas. Entretanto, para os poderosos, a certeza da impunidade é tamanha que parece muito simples: praxe - essa é uma das palavras que mais me assustam, sempre justificando atitudes ilícitas. Ou seja, é o tipo de luxo apenas permitido aos grandes.

Exercendo o ofício de faturar às custas do vício alheio, o Jockey Club, com certeza, não enfrenta grandes crises: o local ainda é palco de alguns dos mais badalados eventos da cidade, incluindo casamentos de celebridades e eventos de socialites. O Cânter Bar, restaurante próximo ao local das corridas, possui um dos almoços com a pior relação custo-benefício que já pude verificar, caríssimo para o que oferece.

Porém, a gastronomia do Jockey se exime de qualquer pecado graças à unidade do restaurante Charlô, do chef homônimo, ícone da boa cozinha da cidade de São Paulo. Ainda tem uma filial da Mercearia São Roque, que ganha status de baladinha entre playboys e patricinhas da cidade.

Como sempre, a solução da prefeitura para o problema é muito simples para os interesses gerais dos mais abastados: comprar o terreno, o que ainda custaria 120 milhões de reais aos cofres públcos, abatendo a dívida de IPTU dos 300 milhões de reais em que a propriedade é avaliada. Dinheiro esse que sai do seu imposto, aquele pago todo começo de ano em cota única ou parcelado.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Mulher para o que der e vier

Ser mulher é mais difícil do que ser homem. Como mulher, jornalista, profissional, filha, namorada, irmã, nunca tive dúvidas dessa afirmação. Mesmo quando algumas pessoas insistem em falar que o gênero feminino domina o mundo, o mercado de trabalho e as universidades, digo: “isso, infelizmente, não quer dizer que exista igualdade entre os sexos”. Concordo quando minha mãe ou, antes ainda, minhas tias-avós diziam: “você não imagina como era na nossa época”. Mas o fato de um dia ter sido pior não significa que hoje seja bom. Como sempre brinco: “uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”.

Por que digo isso com toda certeza?

Trabalhei em diversos lugares e, mesmo vendo que a maioria das jornalistas eram mulheres, os redatores-chefes sempre foram homens. Mesmo quando tive líderes mulheres, eram subordinadas a homens e assumiam um perfil tão masculino que claramente não pertenciam ao mesmo sexo que eu. A socióloga Dulce Withaker diz que as profissões melhor remuneradas, geralmente, são praticadas por uma maior quantidade de homens, pois quando as mulheres começam a ingressar em um setor, ele passa a se desvalorizar.

Os fatos falam por si: duas pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), publicadas em março e em novembro do ano passado, mostraram que as mulheres ganham menos e estudam mais para desempenhar a mesma função que um homem. Elas também enfrentar dificuldades para assumir cargos de comando.

Até no setor gastronômico há diferenciações em vários níveis.

As mulheres são cozinheiras, enquanto os homens são chefs de cozinha. Muitas vezes, quem cozinha em casa, no dia-a-dia da família, é a mulher, ou seja, ela faz o trivial. Enquanto isso, ele é quem faz o jantar especial do sábado ou recebe a fama pela feijoada do domingo. Não sei porcentagens, mas entrevisto muito mais chefs de cozinha famosos do sexo masculino do que do feminino. Isso é visível, pelo menos em São Paulo. Vejam bem, não estou dizendo que não existam cozinheiros homens ou chefs de cozinhas mulheres: Morena Leite e Carla Pernambuco estão aí para comprovar.

Também parece haver grandes diferenças de paladar entre os gêneros. Já ouvi vários chefs falando que as mulheres gostam de pratos leves. Risoto, por exemplo, é comida de mulher; churrasco é de homem. Quando trabalhava na Guia da Cozinha, chegamos a fazer uma pesquisa sobre as preferências gastronômicas dos gêneros e descobrimos que mulheres gostam mais de doces; homens, de salgados. Mas quando eles escolhem uma sobremesa, a preferida é o pudim de leite; enquanto a delas é qualquer uma que tenha chocolate.

Dia desses entrevistei a chef Ariela Dorctors, do restaurante marroquino Tanger, em São Paulo, e conversamos sobre o cordeiro maravilhoso preparado por ela. A profissional comentou algo peculiar: os homens adoram a iguaria, mas é bem mais difícil as mulheres experimentarem o prato (não sabem o que estão perdendo). Sinceramente, não consegui pensar em um por que. Talvez alguém diga que uma questão é biológica, pois elas precisam comer menos; outros podem alegar questões culturais, que as mulheres cresceram achando que não merecem se empanturrar com uma costela na brasa ao molho barbecue. O fato é: azar de quem não come!
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PS (Para Sobremesa): Nem preciso dizer por que escolhi esse tema hoje, né? O Ato Lilly Ledbetter, assinado ontem pelo presidente norte-americano Barack H. Obama, promovendo paridade de salários dos gêneros, oficializa que a desigualdade entre homens e mulheres existe: é visível e latente.

Por Vivian Peres

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Restaurantes na Faixa de Gaza: a gastronomia (im)possível


Imagine administrar um restaurante localizado em uma região onde o abastecimento de comida é precário. Onde boa parte dos alimentos é fornecida por grupos humanitários e assistencialistas internacionais: 80% da população precisa receber ajuda, segundo dados da Anistia Internacional. É isso que acontece há 18 meses com os chefs de cozinha de estabelecimentos da Faixa de Gaza – após o bloqueio imposto por Israel e muito antes dos bombardeios das últimas semanas.

Pode parecer inacreditável, mas a região possui bons restaurantes, a maioria deles localizada em hotéis, além de uma ampla gama de tendas oferecendo comida árabe genuína. Aliás, diga-se de passagem, é muito fácil perceber quão rica e saborosa é essa culinária. São Paulo conta com estabelecimentos de primeira linha que apostam nesse tipo de cozinha. Nos Estados Unidos, os restaurantes ficam abarrotados.

Em reportagem publicada ontem (27 de janeiro), o enviado especial da Folha de São Paulo à Faixa de Gaza, Raphael Gomide, conta que no hotel Commodore, em que está hospedado, só se pode comer frango, frito ou assado, com salada, o que dispensou até mesmo a necessidade de existir um cardápio no estabelecimento.

Mas uma história que me chama muito a atenção é a do restaurante Roots, localizado na Cidade de Gaza. O local aparece em críticas gastronômicas de jornais internacionais, como o norte-americano The New York Times e o britânico Independent. Em 2007, o restaurante foi alvo de explosões, que destruíram um salão anexo. Desconfia-se que os ataques foram realizados por um cliente barrado por tentar jantar no local sozinho: o restaurante só atende famílias ou casais.

Apesar disso, e de seguir a regra de não comercializar bebidas alcoólicas, a proprietária Muna Al-Ghalayini, é considerada uma pessoa liberal para a cultura local. Isso porque, por uma antena parabólica, o televisor do estabelecimento transmite novelas árabes e séries norte-americanas. É possível comer uma salada Daqqa, uma das especialidades da região, vendo um episódio de Friends. Ou, pelo menos, era, antes da comida ficar realmente escassa na região.
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Na foto, ambiente do restaurante Roots. Crédito: Ali Ali (The New York Times, 9 de setembro de 2008)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Feliz ano-novo


Hoje, entramos no ano do Boi. Segundo o horóscopo chinês, é um período da consciência de que trabalhar é preciso. Ano para ter disciplina e responsabilidade. Nada mais necessário, em um período marcado por uma crise causada, antes de tudo, pela combinação perigosa entre a falta de regras e a irresponsabilidade. Em um ano como o que começa nesta segunda-feira, os chineses fornecem a possibilidade de semear frutos e crer no futuro.

Entretanto, justamente neste momento, a capacidade de recuperação da economia emergente mais significativa da atualidade está em xeque. Na última edição impressa do semanário econômico The Economist, lançada no sábado (24 de janeiro), a pergunta do título define o pessimismo com relação ao país asiático: “Strong as an ox?” (Forte como um boi?). O texto é bastante enfático e ironiza a simbologia do ano-novo chinês dizendo que um boi é, normalmente, um touro castrado e assim pode ser descrita a economia do país daqui para frente.

Grosso modo, podemos resumir o panorama futuro dizendo que a China continua crescendo, mas está fazendo isso muito mais devagar e em níveis bem menores. A produção industrial, por exemplo, saiu de um incremento de 18% em 2007, para 5,7% em 2008. Conforme o resto do mundo mergulha ainda mais em recessão, os problemas chineses tendem a aumentar: calcula-se que o PIB não deva crescer mais do que 6% em 2009, o menor patamar em duas décadas.

Porém, não custa nada tentar contar com as velhas sorte e sabedoria orientais. Podemos começar apostando nos bons agouros trazidos pelos biscoitos da sorte, exemplo visível de que o país tem criatividade para lidar com crises. Diz a lenda que eles surgiram no final do século XII como arma para enfrentar o exército de Gengis Khan. Como os inimigos não gostavam desses quitutes, os chineses passavam informações confidenciais para os generais dentro deles. Ganharam a guerra e a dinastia Ming subiu ao poder.

Quem sabe não podemos trocar informações sobre o mercado financeiro por meio de biscoitinhos da sorte? Frases como “procure ser prudente, a economia global agradece” cairiam como uma luva. De qualquer forma, mesmo com trabalho duro, a China dificilmente voltará à velha forma, pelo menos no ano do Boi, mas não custa nada tentar.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Ano-novo chinês

Segunda-feira, dia 26, celebra-se o ano-novo chinês. Por isso, no próximo final de semana, haverá comemorações na Liberdade, em São Paulo. Pretendo comparecer, como gosto de fazer todos os anos. Trarei novidades para alimentar esse blog com ares do oriente e gosto de molho shoyu.

Aguardem...

Um pouco de tempero...
Minha amiga Lelê Godoy disse que saiu hoje uma matéria no UOL com a seguinte frase: "SP é a capital da Gatronomia: todo mundo come todo mundo". E o assunto era o trânsito!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

10 bailes, 120 cozinheiros e uma posse com maratonas


Alguém já foi a dez bailes em uma mesma noite, ou, pelo menos, conhece alguém que tenha ido? Foi o que fizeram Michelle e Barack H. Obama na madrugada da última quarta-feira (22). O engraçado é que a televisão noticiou o fato como algo corriqueiro, a coisa mais natural do mundo: “Michelle e Obama ainda vão participar de dez bailes oficiais. Boa noite!”. Como assim DEZ?

Os dois passaram o dia inteiro em pé, andaram por Washington com um baita frio e ainda tinham uma verdadeira maratona pela frente. Alguns veículos de comunicação ainda questionaram por que eles não levaram as filhas, sendo que elas não iriam mesmo à escola no dia seguinte. Roubaram o bom-senso.

Como o assunto deste blog é política com tempero, não poderia deixar de dar mais detalhes sobre aspectos gastronômicos e sociais dos eventos, tradicionais entre os presidentes norte-americanos.

Pois bem, na verdade, para o casal da presidência, não se trataram de dez bailes completos, mas, basicamente, de dez danças em salões diferentes, cada uma seguida de discurso especial. A bebida oficial foi champanhe, bem específica para a celebração, mas servida quente, graças à grande lotação. Uma das maiores novidades da lista de eventos foi o Neighboorhood Official Ball (Baile Oficial de Vizinhança), destinado a moradores de Washington, ideia do Comitê Presidencial de Inauguração.

Para meu alívio (já estava achando que estou velha), seis dos eventos aconteceram no mesmo local: Walter E. Washington Convention Center.

Quem comanda a cozinha de lá desde os bailes inaugurais do segundo mandato de Bush é o chef Greg Sharpe. O cardápio para as 42 mil pessoas presentes incluia dois pratos principais: Frango Role à Italiana e Torteline com Molho ao Sugo de Tomate Orgânico. Sobremesas só foram servidas em dois dos bailes: os dos estados de Biden e de Obama.

Sinceramente, já fui a incontáveis jantares com melhores escolhas gastronômicas. O menu de Abram Lincoln, por exemplo, foi incrivelmente superior (veja na foto, o cardápio de um dos bailes da posse dele. A imagem é fornecida pelo Smithsonian Institute).

Para deixar tudo pronto até terça, Sharpe comandou 120 cozinheiros, que começaram a trabalhar no domingo. O chef relatou algo muito interessante em entrevista ao Washington Post: para os bailes de Obama, o Serviço Secreto norte-americano foi dez vezes mais severo nas inspeções e regras do que nos do antecessor, verificando cada detalhe da preparação das comidas oficiais. Detalhe: só de molho, foram preparados 900 litros.